quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Short Novel - Heróis de Areia ~ Capítulo 10: 達した!

Capítulo 10: 達した!


O que acontece quando um Hunter é atingido?
O resultado é o mesmo pra quem se admite Hunter ou pra quem reconhece a falta de capacidade para tal. O destino é justo e não faz distinção. E é muito pior que a morte.
A vítima de uma Lullaby se torna inválida nesta sociedade desconhecida em número de população. Inválida e perigosa.
Quando um Hunter é atingido no coração por um projétil de Lullaby, é muito mais eficaz e mortal. Daí, para o cérebro ser infectado é questão de minutos. Porém, quando é atingido na cabeça, o veneno entra mais lentamente no cérebro, e consequentemente causa confusão, tomando de forma devagar o corpo todo.
Tanto no crânio quanto no peito (se assim for a vontade da Lullaby), o caçador perde a maioria dos seus poderes e a quantidade de Egocon absorvido em toda a vida até o momento é extinguido à zero, fazendo com que, aquele corpo que em outrora evoluiu e ficou forte através dessa energia proveniente das criaturas, se atrofie de forma considerável, ficando frágil. 
Independente do lugar atingido, o poder máximo dessas criaturas se concentra na ilusão que seu alvo é vítima. Ela é profunda, sarcasticamente constante e dolorosamente incerta de ser superada. Na maioria das vezes essas ilusões deixam suas vítimas fora da realidade, sendo incapazes de fazerem coisas pela sua sanidade duvidosa. O doente vê coisas que não existem de fato, conversam sozinhos constantemente, se tornam fragilizados feito crianças e agem como uma em períodos indefinidos. Resumidamente, apenas seu corpo está ali, presente. Embora evoque lembranças fragmentadas de quem é ou o quem foi, já não se tem mais controle direto do corpo: seus movimentos não lhe mais pertencem e as batidas do coração da vítima mantém aceleradas até o fim da ilusão, caso essa tenha realmente um final. As sequelas ficam localizadas na mesma região.

Se o corpo está ali, para onde vai a essência do Hunter?

Essa é uma tese não provada, exceto pelo fenômeno "volta do ser".
Voltar da ilusão é algo bem difícil de acontecer. As lendas dizem que, para que isso aconteça, o primeiro passo é a consciência "despertar" no lugar onde foi parar. Geralmente,essas mesmas teses apontam para um lugar profundo dentro do próprio espírito da vítima, onde o Hunter se encontra selado pela ilusão das Lullabys.
Uma vez "desperto", voltar para a superfície é a experiencia mais terrível de se passar. É como se a ilusão apagasse todo o senso da verdadeira realidade e colocasse no lugar a "verdade segundo a visão das Lullabys".
Elas vivem em uma. Os Hunters em outra. E é por isso que é tão sofrido a volta do caçador para a sua realidade esquecida. Funciona como se a vítima pensasse e agisse num cenário montado em tão perfeita harmonia, até descobrir, aos poucos, que até estar em certo lugar, de fato, nunca esteve. É assombroso e maligno o efeito colateral dessa maldição.
Muitos perecem ou morrem tentando voltar para a superfície. É tão lancinante e intensa a dor que, de cem Hunters atingidos, trinta conseguem voltar ao estado que se encontrava antes de ter sido alvo da ilusão. É uma escalada inumana, das profundezas até a luz do esclarecimento de quem é, na realidade.
Neste caso, na ilusão, quem controla o corpo, enquanto o Hunter está "adormecido"?

As Lullabys, claro.

Elas possuem o código exato das memórias e consciência da vítima e usa parte dela para que aquele corpo vivo lhe sirva como escravo. Algumas não usufruem muito dessa capacidade. Outras exploram até a morte aquela pobre alma, definhando-o lentamente. Essas, geralmente mais poderosas do que as Lullabys comuns, fazem uma ação imperdoável, que são uma das que deixam o vasto deserto em colapso: essas criaturas colocam Hunters contra Hunters. E algumas vezes as batalhas chegam até a morte de um deles ou dos dois.
Essa profunda ilusão transforma completamente um Hunter, tornando-o diferente daqueles que são abandonados a mercê desse mesmo poder. Uma vez escolhido como "escravo", as Lullabys emprestam um pouco de seus poderes e os Hunters se tornam bem fortes e agressivos devido a essa estranha devoção. Por isso que as batalhas entre os caçadores são extremamente violentas. Enquanto dentro da mentira, são chamados de Iludidos, Dominados ou Pets, sendo esse último termo o pior a ser pronunciado, comumente usado por elas.
Se não bastasse o poder esmagador da ilusão, ter o poder de controlar certos Hunters transforma o chão arenoso do mundo em vermelho-terra, imperando guerras entre irmãos de consideração.
Em um ponto, visto lá de cima interpretado como qualquer outro grão de areia, um Hunter está de indo de encontro ao outro, desejando eu seu interior que não tenha lutas. Porém, indo armado, só prova que ele está, mais uma vez, contando uma mentira para o seu coração.

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Match Tide Village é um vilarejo fantasma onde no passado moravam poucos Hunters e muitos homens normais, conhecidos como Peacemakers. Provavelmente foi esse o número que decidiu o destino do qual essa vila se encontra hoje. Lembrando vagamente a arquitetura do Velho Oeste, as casas de Match Tide Village permanecem repousadas desta forma. Não passa de quatrocentas moradias, tendo direito a uma só praça central onde em outrora discutiam os problemas da cidade ou as invasões das Lullabys. Houve um dia que tivera a última reunião, antes de algum grupo de criaturas passarem executando todos os homens que ali se encontravam ou se preparavam para a guerra. A maioria das casas estão intactas, apenas com marcas de tiros para todos os lados. Dá para imaginar onde as lutas foram mais intensas, pois essas moradias nem teto tem. Paredes foram varridas e grandes buracos dão a impressão de violência que passara pelo local. Marca de sangue seco está por toda a superfície. Olhando o cenário e o que sobra dele, sente-se um gosto amargo de injustiça em comparação aos poderes das Lullabys contra o dos homens.
Ao redor, não muito distante dali, permanecem intactas apenas Gardens que hoje não possuem mais seus Hunters. Parecem que esses reuniram-se e resolveram morar perto de seus jardins, construindo um vilarejo e tentando morar sozinhos, mas dependendo da ajuda um dos outros. Não se pode morar para sempre nas Gardens: os homens precisam de sua independência, cedo ou tarde. Seguir adiante, com seus sonhos escassos neste deserto. Só não se sabe o que passou na cabeça desses Peacemakers em pensar que nunca seriam atacados pelas Lullabys. Poderiam ao menos deixarem de ser preguiçosos ou que poderiam desenvolver um diálogo amigável com essas criaturas, e aprender um truque ou dois para se defenderem.
Escolheram viver pacificamente. Encontraram a morte mais horrenda. Ou a ilusão mais profunda, e nem sabem que são vítimas de uma mentira. Mais triste ainda são essas Gardens, esperando a volta dos seus que nunca mais chegarão para tentar desenvolver a rara Ressonância.
Gipsy caminha em direção à Match Tide e, no caminho, encontrou o Hunter que lhe fez a ligação.
Contara que ele e o amigo dele estavam explorando a região atrás de suplementos quando se deparou que haviam duas Lullabys no vilarejo, e Glasses surgiu de repente. Aparentemente estava escondido, esperando a hora certa de atacar. Ele conseguiu trocar muitos tiros e golpes com as duas criaturas e, quando esse Hunter se aproximou com seu amigo para tentar ajudar, Glasses negou e pediu para que não interferissem na batalha. Uma das Lullabys cochichou algo com a outra e saiu da batalha, partindo para o leste e deixando sua amiga contra o Hunter. Talvez a noite teria sido a vantagem da criatura, e antes mesmo da luz do dia raiar no céu do deserto, Greenglasses fora atingido, caindo de joelhos na praça central. Só quando a Lullaby se deu por satisfeita e foi embora, é que os dois Hunters exploradores se aproximaram do amigo de Gipsy, que pediu, muito ferido, para que entrasse em contato com o DeepSea.
Ainda demoraram um pouco pois o aparelho de comunicação que carregavam na exploração estava muito velho, dificultando estabelecer as ondas de comunicação. Desejaram sorte para Gipsy e Glasses, mas que muito provavelmente o segundo já se encontrava na praça central batendo a cabeça no chão e babando pelos cantos das ruínas assim que Gipsy chegasse lá.
O portador da Lúdica se despediu da dupla e seguiu em frente. Não muito tempo depois, estava na entrada do vilarejo fantasma. Passou um monte de possibilidades pela sua cabeça: perguntas sobre o que Greenglasses estava fazendo todo esse tempo e o que deu nele de querer enfrentar duas Lullabys sozinho. Pensou também na hipótese de tudo ser uma armadilha dos Hunters que entraram em contato com ele, ou até mesmo uma armadilha de alguma criatura que estivesse escondida em Match Tide. Um pouco de si queria que tudo isso fosse verdade. Ao menos, pouparia da difícil missão de ter de enfrentar seu próprio amigo, caso ele fosse vítima de uma ilusão profunda.
Adentrou por entre as casas e vielas, e instintivamente carregava a arma de fogo e sua outra mão jazia na bainha da espada estranha. Caminha pé ante pé sem fazer barulho nenhum, se esgueirando até a praça central. O cenário para o homem não era desconhecido: havia passado ali muitas vezes, antes e depois do massacre.Só não tinha o mapa mental exato do local. Mas para onde deveria se dirigir, ele sabia de olhos fechados.
Chegou no centro do vilarejo com a leve brisa que rodeava o local. Estranhamente o Sol estava por entre raras nuvens e não fazia tanto calor como os heróis da areia estavam acostumados. Enquanto Gipsy saia de uma sombra que tomava um corredor estreito entre grandes barracos, Greenglasses permanecia na luz, ainda de joelhos, curvado pra frente e os braços soltos, com as mãos largadas no chão empoeirado. Cabeça baixa, escorria sangue de sua testa.A luz do dia projetava em seu rosto uma certa sombra onde, naquela distância, não dava pra distinguir se seus olhos estavam fechados ou não. Seus óculos de lentes verdes fundas, típico de motoqueiro do deserto, que sempre usou acima de sua testa, está trincada e sua armação arrendondada de aço bem arranhada. Glasses dessa vez havia passado dos seus próprios limites.
Gipsy foi se aproximando com cautela, olhando para todas as direções rapidamente, mas perdia mais tempo fitando diretamente o amigo.
Ouvindo os passos, Glasses levantou com certa dificuldade a cabeça e da sua boca caia uma bela linha grossa e vermelha. Sorriu de uma forma fraca e sem graça, sem mostrar os dentes, e com os olhos semi-cerrados:

— Amigo...! Você está um pouco atrasado — Falou com a voz fraca.

— Glasses...Oh, Glasses. Você..? —  A voz de Gipsy  saiu com uma enorme pena do amigo ali ajoelhado, como se não quisesse acreditar no que estava vendo.

— É, pois é. Fui atingido novamente, Gipsy. Há... Acho que eu nunca aprendo, né?

— Não fala assim, companheiro. Olha, eu estou aqui...

— Obrigado por ter vindo —  e tossiu, cuspindo sangue na areia da praça central, respingando num monumento que servia como o marco zero do vilarejo.

— Posso ver o quanto isso é preocupante, Glasses? — Gipsy foi se aproximando cautelosamente dele, fazendo menção de abaixar perto do amigo, mas assim que se aproximou e observou a ferida, ele levantou num rápido movimento, levou sua mão na boca e se virou pra trás, andando em círculos com passos nervosos de quem não sabia o que fazer ou pra onde ir.

— Agora entendeu o por que pedi para te chamar? —  Greenglasses forçava um humor de um moribundo. Vez ou outra tossia e mais sangue era expelido daquele corpo que se aventurou onde não devia.

— Por que, meu, por que você se descuidou a esse ponto? —  Gispy se encontrava tenso, fazendo gestos exagerados e apontava pra ferida profunda no peito do amigo.

— Poupe-me do sermão dessa vez. Só desta vez... —  após uma pausa, continuou —  Eu te chamei porque eu confio em você e só você pode me realizar esse favor. Você pode fazer por mim?

Glasses começa a chorar. Suas lágrimas já não são mais de desespero, mas de uma tristeza lamentável. Descem quentes e lava um pouco o rosto sujo de terra e sangue. Gispy se comove com a cena e o pedido do amigo:

— Antes que o veneno se espalhe e me traga as trevas da ilusão, antes que ela possa controlar meu corpo e minhas vontades, por favor —  E, levantando com dificuldade, ele traz com as mãos seus óculos até os olhos —  Lute comigo e me vença.

Era isso que o coração de Gipsy temia. Que a Lullaby jogasse Greenglasses contra qualquer Hunter que aparecesse no caminho.

—  Será uma honra cair aos seus pés como um bravo Hunter, Gipsy! Mas você demorou um pouco....Sinto que ela já tem parte do controle do meu corpo. Por favor, não demore e venha com tudo pra cima de mim. Lhe darei uma boa luta.

Suas lágrimas saem de forma mais intensa, e range os dentes de raiva, por pedir algo tão doloroso para o amigo. Não era a primeira vez que passavam por isso juntos. Mas nunca há a certeza de salvação.
Gipsy passa o braço nos olhos, secando algo que não deixou Greenglasses ter a certeza do que era.
Seu esforço foi  em vão: no movimento onde Gispy levantou sua arma de fogo para a testa do parceiro, uma gota salgada caiu no chão ensanguentado, dando início a uma dolorosa batalha...






                                                                                             Fim da primeira temporada















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