Capítulo 19: A OBSESSÃO E A MURALHA
O corpo de Gipsy estremecia violentamente no chão. Era o sistema nervoso dando o seu "adeus". Se tentava dizer algo, engasgava com o próprio sangue que substituía a saliva seca. Jorrava, praticamente, o líquido vermelho da boca e da imensa ferida. E a areia aprontava-se para absorver mais daquilo, independente da raça tombada. Diziam, por todos os cantos do deserto, que o deus da areia tinha uma sede especial pelo sangue dos homens. Bebia do suor deles, e secava o corpo dos pobres humanos. Deus vil, que parecia não importar-se senão apenas pela própria sede infinita...
Cordas abaixou-se, pegou o maço de cigarro no bolso da jaqueta negra de seu amigo, que por sorte não fora cortado, mas seu suporte estava manchado de sangue; acendeu um e ficou ali, parado, de pé e de olhos fechados, como se esperasse alguém.
Aquele corpo empapado de sangue começava a lhe dar nos nervos, quando ouviu passos naquele caos silencioso. Dirigia-se, calmamente, pela planície de corpos da platéia, em direção ao palco. Passos estes firmes e graciosos, quase na ponta dos pés. A dona dos passos, que não parou e continuava avançando, começa:
— Isso tudo era alguma rincha ou inveja de seu amigo, Cordas?
— Não, Florença. É a sua ilusão que é uma bosta.
O Hunter espiou rapidamente para o lado e viu o corpo do falso amigo sumir em pétalas de rosas. Voltou a olhar para Florença, que ainda caminhava calmamente até o palco.
— Isso....foi muito grosseiro...! — Disse, ofendida, a Lullaby.
— Oh, desculpe-me! Não quis ofender! Você acertou em muitos pontos. Tudo aqui é muito mais real do que qualquer Lullaby poderia fazer. Na última hora, como de praxe, você erra em um ou dois detalhes.
— ...
— Florença, eu não sei o que você pensou quando fez isso, ou se talvez não tenha total controle da sua ilusão , mas o erro está justamente em colocar Gipsy nela. Pensou que enrolaria-me com a presença dele?
— Eu...ah...Eu não entendo como você...?
— Estávamos, Gipsy e eu, juntos, apenas uma vez em Two-Cannons. Mas, naquela ocasião, e sei que você se lembra muito bem, a festa já havia acontecido e ele estava sob domínio de sua algoz. E veja só: você também estava lá! Foi onde tivemos a nossa primeira batalha, e foi quando Gipsy quase matou todos nós!
A Lullaby estava em pânico. Ou qualquer termo que seja sinônimo de "confusão" para uma raça pensante. Perguntava-se como, naquele estado de profunda ilusão, Quatrocordas poderia lembrar ainda de tudo.
— Aquele desgraçado sacou a arma e resolveu atirar em todos, só pra ter certeza de que acertaria até a criatura que o controlava. Embora ele não soubesse que estava sendo controlado, ali ele ja desconfiava de algo. Pra quem não raciocina muito nestas horas, isso era realmente típico de Gipsy. Era isso que faltou para a sua ilusão ser "perfeita".
— Isso...isso é INACEITÁVEL! — Grita a Lullaby! — Como você lembra disso aqui, agora? Era...era pra você aceitar essa ilusão como verdade absoluta. Recriei o cenário, os Hunters ao redor. A noite e as estrelas! Como? COMO VOCÊ PODE SE LEMBRAR DA VERDADE?
Florença esboçava desespero.
— Metade da resposta está em Gipsy. A presença dele, em todas as cenas que eu lembro dele, são muito marcantes; bom pra minha memória de peixinho. — Cordas deixa escapar um riso — Apesar de você retratar as manias e os movimentos dele muito bem. A outra metade, Florença, eu te convido a ver um pouquinho mais de perto.
O Hunter dá a última tragada, joga fora o cigarro e diz:
— Venha, aproxime-se! Chegue mais perto... se puder!
A Lullaby enfureceu-se como nunca tivesse feito isso antes! Tamanha raiva e descontrole tomou seu coração e movimentos; seu corpo agora ignorava qualquer patente do escalão EX- CUTION e partiu para cima do Hunter, com força para faze-lo em pedaços, controlada pelas cordas manipuladoras das irmãs infernais Ira e Cólera.
Voou para cima de Quatrocordas mas, ao chegar perto do palco, levantou-se uma muralha de terra, grossa e resistente, cercando o homem como uma caixa. Isso fez com que Florença levasse um susto e desviasse a poucos centímetros da proteção criada.
— Isso é impossível! IMPOSSÍVEL!!! — esbraveja Florença.
— Não é nada impossível! Você pode me fazer de gato e sapato com meu corpo lá fora. Posso não ter habilidade o suficiente para enfrenta-la no deserto. Mas aqui dentro, Florença, sou eu quem manda nesta porra! E você não vai me atingir!
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No mundo real, distante dali, o chapéu de Gipsy nem havia chegado ao chão quando Iuvenis percebeu que o Hunter já estava do seu lado, atacando pelo seu flanco esquerdo. Virou a coronha da sua Sniper, e os três cortes rápidos da Lúdica foram bloqueados, por pouco.
Ele aparentava estar com pouca paciência, sacando a arma e dando três tiros em direção a Lullaby que desviou dele com facilidade. Em seguida, afastou-se do Hunter, deslizando com repetidos pulos para trás.
— Eu poderia jurar que eu o tinha acertado. No entanto ele tá de pé, bem disposto — pensou Iuvenis.
— Está pensando no que? — perguntou Gipsy.
— Hm... em nada. Eu acho...eu só acho que eu te subestimei.
— Típico da raça de vocês. — Sorri o Hunter.
— Tem algo de errado neste caçador... — mentalizou a Lullaby.
O homem corre na direção da criatura, desliza pela areia e dá um corte horizontal na altura do joelho da rival. Esta sem tempo de virar seu rifle e colocar Gipsy em sua mira, apenas pula, de forma reta, e bem alto. Gipsy olha para cima e salta também, para alcançá-la.
— Quantos de nós você ja derrubou? — Pergunta Gipsy no ar.
— Alguns. Não muitos... — Responde Iuvenis, acima dele, ainda ganhando altitude.
— Hm...
A luta poderia estender-se no ar por mais alguns longos segundos. Encaixaria, naquele momentos, e porque não dizer "bem vindos", golpes com a lâmina ou disparos de sua arma. Entretanto, a oculta e estranha opção de recuar do Hunter o fez voltar para o solo e esperou a Lullaby fazer o mesmo.
Na superfície de areia, os dois encaravam-se novamente. "Esse Hunter só pode estar variando das idéias", pensou a criatura. "Quando eu acho que ele vai esticar a batalha, agir como um Hunter realmente age, ele assombrosamente recua. E que diabos foi aquele primeiro contra-ataque dele? Ele teletransportou?"
Saiu de seus pensamentos e notou que Gipsy a encarava com os olhos apertados. Sutilmente, começou a andar para o lado, joelhos levemente flexionados; virado totalmente pra frente, fitando a Lullaby. Trocando cuidadosamente seus passos para o lado, circulava, em sentido anti-horário Iuvenis, com distância segura.
Esta, por sua vez, optou por ficar parada, apenas observando atentamente. Interpretou uma grande perda de tempo, os movimentos do Hunter. Decidiu dar um basta, afinal, a situação daquele lugar prometia piorar. Quando olhou nos olhos do homem, pronta para mira-lo novamente em seu rifle, sentiu uma estranha sensação.
Conseguiu coloca-lo na mira mesmo assim, todavia seus movimentos eram como se fossem totalmente estranhos para si mesma. Não notou quando ela começou a imitar perfeitamente os movimentos de Gipsy de forma inversa, como se fosse um reflexo do caçador. Ele não deu sinal que faria um movimento rápido, de súbito, para cima da criatura.
Ela piscou, tomada por uma dormência agradável que a rodeava, Mas, após piscar, a sensação sumiu e precisou decidir em realizar dois movimentos diferentes nos dois milésimos de segundos que se seguiu. No primeiro, notou a ausência do homem que estava até agora pouco na sua frente. No segundo, sair da posição de atirar e usar sua arma instintivamente para se defender.
A lâmina da Lúdica por pouco não afundou em seu pescoço. O homem estava, de forma inexplicável, perto dela novamente, pressionando o metal afiado contra o rifle. Os olhos de Iuvenis estavam bem abertos, assustados com o tranco do ataque surpresa.
— De novo! — Ela pensou — De novo ele pareceu ter sumido diante de meus olhos.
Iuvenis segurava horizontalmente o rifle como um cajado que defendera um ataque. Colocou um peso abominável, mais do que seu corpo lindo e esguio permitia, nos seus pés, fazendo- os afundar no chão, rachando-o. Em seguida, empurrou para frente com sua arma o ataque do homem, fazendo-o recuar a metros de distância.
— Como fez isso?
— Huh?
— Você sabe, sumir da minha frente novamente...
— Eu...?
— Não se faça de idiota! — Iuvenis esbravejou.
— Mas eu não fiz nada — retrucou o homem.
Ele suspirou. Exibia realmente uma inocência e era convincente em suas palavras. Iuvenis acreditou nas palavras dele, e isso a incomodou muito mais.
O homem guardou a arma e a espada. Voltou para a posição inicial. Sem qualquer defesa, parado, sem tirar os olhos da Lullaby, como se estivesse dentro do seu próprio barraco observando um móvel qualquer.
— Não vai me atacar?
— Agora não...
— Por que, maldito?
— Porque eu não estou afim.
— Construí, ate hoje, uma ideia totalmente errada de vocês, Hunters. Achei que, quando entrassem em uma luta contra a nossa raça, fariam de tudo para sair vencedores. Agora explica o fato de muitos estarem tombando ou sendo nossos escravos nos últimos tempos. Com atitudes dessas, não esperava menos da sua raça limitada!
Enquanto o tempo não decidia se trazia de uma vez a tempestade de areia ou não, o vento que cruzou os dois e trouxe uma poeira densa entre eles, fez com que Gipsy evaporasse no ar, assim que esta passou. Iuvenis piscou uma ou duas vezes e espantou-se novamente com essa facilidade do Hunter de sumir diante dela e, nervosa, ergueu novamente a espingarda na direção de onde ele sumira. Contraiu os músculos do dedo e estava pronta para atirar naquela mesma direção, na pressa em que achava que o homem pudesse estar ali, usando algum truque que lhe causasse uma ilusão de ótica. Olhos bem atentos, apertados, fitando com meticulosidade a frente. Um grão que passasse arrastado pelo vento de forma "diferente" e Iuvenis mostraria o quão a juventude dela nada está ligada ao tiro rápido e certeiro que esconde um nível quase milenar. Um sopro quente, bem perto do seu ouvido esquerdo, desceu cinicamente carinhoso, percorrendo seu pescoço abaixo como uma lufada cautelosa, dizendo:
— Nunca mais me compare a qualquer outro Hunter.
Iuvenis deixou escapar um gemido de susto, medo e uma minúscula sensação de êxtase. Estavam as três sensações tão bem misturadas que seria impossível separa-las: davam as mãos umas para as outras, sem largar. Se tentasse, apertavam ainda mais, causando dor e resistência. Ali, uma não vivia sem a outra. Entretanto não havia tempo para refletir sobre, ou qualquer vergonha que tenha escapado delas, corando a face da Lullaby e liberando um leve tremor pelo corpo dela. Este, por sua vez, não encontrou audácia para sequer virar-se para a voz, ou largar o rifle ou esboçar qualquer contra ataque ou defesa.
O cérebro dela trouxe rapidamente a informação de que aquela voz era de Gipsy. Mesmo não conseguindo virar para trás, ela não sentiu nenhuma ameaça sendo criada por movimentos mortais vindo do Hunter.
Com ótima audição, acertou ao perceber que Gipsy mantinha a espada presa aos cintos.
"Claro", pensou Iuvenis. O Hunter jamais usaria a espada, embora fosse para combate corpo a corpo. Por ela ter provocado o homem como o fez, deveria estar preparada por qualquer reação do indivíduo, da mais simples à mais complexa ou apelativa. Subestimou-o segundos antes de sentir, no meio de suas costas, a ponta da arma dele delicadamente gelada. Seu corpo esbelto parou de tremer ao ser tocado. Iuvenis admitiu, em algum lugar obscuro da sua mente, que descuidou-se e deixou que aquela ação, por parte dele, ocorresse. Estava ainda mirando para frente com sua espingarda, e confusa quanto ao que fazer ou sentir.
Decidiu ficar imóvel. Fingir que não sabia que estava prestes a ser derrubada estava fora de questão pelo cessar rápido do arrepio quando a arma encostou na sua espinha. Dali pra frente, tudo teria de ser minuciosamente calculado se quisesse sair ainda com vida. E é óbvio, se houvesse tempo para isso.
Por parte de Gipsy, o leve desconforto que ouviu naquelas palavras da Lullaby deu as boas vindas à irritação, que passou a comandar as ações nos instantes futuros. Diferentemente das ações anteriores, que jamais foram contadas sobre a vida deste, essa irritação era "consciente". Ao passar dos anos, Gipsy foi possuindo um controle maior de suas ações, de seus pensamentos, tendo apenas como foco a realidade de merda que ele mesmo julgava viver. Fosse em outro momento, ele ja teria perdido as estribeiras e teria dilacerado, sem pestanejar, a Lullaby.
A verdade é que, ao longo deste tempo, Gipsy esbarrou com homens e Lullabys marcantes, e prova que, ambas as espécies, são bem perigosas. Um movimento em falso, e a morte ou a eterna submissão poderia vir de ambos os lados.
Ainda sim, sua irritação consciente pensou demais e ,sem saber se foi de forma proposital ou não, apertou gradativamente o gatilho da sua arma.
Iuvenis conseguiu, no ápice de sua atenção, entrar em sintonia com o apertar gradativo do Hunter que desejava tomba-la. Sem fazer quaisquer movimento brusco para não influencia-lo a aperta-lo de vez, na mesma posição que se encontrava, a Lullaby afrouxou os braços, sem tirar o olho da mira, a princípio. Em seguida, deslizou suavemente, imperceptível, em cima dos segundos, largando sutilmente a arma. quando Gipsy chegou no fim do curto movimento que traria, do gatilho, o tiro de vitória, Iuvenis ja estava livre do peso do rifle, e mostrou pro homem o que o corpo dela é capaz de fazer.
O tiro foi executado, e a bala correu pela imensidão do deserto, se perdendo naqueles grãos ao ar.
Gipsy só conseguiu acompanhar o corpo distorcido da criatura quando esta escapou da bala, refugiando-se na diagonal superior de sua mira.
Perto dele, aos seus pés, apenas o rifle da Lullaby. Ela ainda aproveitou e distanciou-se, pulando para trás, sumindo na poeira que ganhava densidade pelo vento.
— Já dei chances demais para começarmos de verdade isso tudo! Será que você não acha que está na hora de levar isso mais a sério? — Gipsy grita na direção de onde ela sumira no vendaval.
Não obtendo repostas e quase sendo obrigado a fechar os olhos pela areia que valsava cada vez mais impetuosa, Gipsy tirou do bolso interno da sua jaqueta um óculos riscado, porém transparente, que o protegia sua visão de situações como esta. Com a visão um pouco melhor, ainda não sabia onde a Lullaby se escondera. Colocou o pé em cima do rifle, e riu sarcasticamente:
— Teria sido melhor se tivesse camuflada nesse vendaval todo com sua arma. É uma pena porque eu não vou tirar o pé daqui e facilitar pra você.
Ergueu o braço com a arma e apontou pra onde pode, esperando ela aparecer. Um vulto fino e veloz bateu na sua arma, ricocheteando ela para o outro lado, dando piruetas e caindo atrás dele, longe, quase sumindo no seu campo de visão distorcido pelo vento e pela poeira. Ele se assustou com o ataque e não identificou o que batera em sua arma. Pensou em sacar a espada e colocando a mão na bainha, rapidamente a tirou como se levasse um choque da própria arma branca.
— "Ela quer que eu saque as armas que eu tiver para tira-las de mim"— Gipsy pensou. Preferiu deixar sua lâmina na cintura e ver qual seria a próxima ação.
Essa tensão lhe trouxe um cínico sorriso no rosto e fez com que colocasse uma pressão a mais no pé que tinha por baixo a sniper da Lullaby. Pareceu que a criatura sentiu a sensação de ser pisada tal qual a sua arma, de modo que o mesmo vulto saiu da cortina de poeira do deserto e acertou em cheio a canela direita do homem, batendo e enrolando logo em seguida. O chicote de Iuvenis puxou com um tranco forte o corpo daquele ser, caindo e batendo a cabeça no chão. Ainda conseguiu virar e tentar agarrar o rifle da criatura, mas foi sendo arrastado e, ao completar a primeira volta, já estava com o corpo centímetros do chão, enquanto girava com velocidade.
Largado, Gipsy aterrizou metros adiante, se chocando num amontoado de rochas invisível pelo vendaval.
Tonto, correu para detrás do que sobrou das rochas e disse pra si mesmo:
— Caramba! Um chicote! Por que o Higher não me reportou isso?! Tsc, a coisa tá ficando boa!...
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Barulhos surdos, seguidos num ritmo caótico, vinham de fora, quase como ecos. Dava a impressão de que a barreira que dividia Cordas e Florença era feita não de matéria sólida, mas de tempo. Dentro da sua concha, o homem encontrava-se de cabeça baixa, olhos fechados, meditando como se a parede que lhe protegia dependesse disso.
Hunters comuns procuram outros Hunter para ensinar-lhes algo de útil. Ótimos Hunters procuram outros Hunters quando querem compreender o maior de todos os professores: o deserto.
Quatrocordas ensinou o básico desta técnica aos outros do Deep Sea sem sequer dirigir a palavra a eles.Porém, nem de longe são considerados os melhores. Há verdadeiros Hunter que, como num passe de mágica, tinham o controle da situação, das Lullabys, do Destino...
Essa transição temporal fazia com que ficasse difícil sobreviver.Também não foi fácil para ele.Pra ninguém, quando nasce neste mundo, nestas condições, nesta realidade.
Se a vida deu uma fortaleza do lado de fora para este Hunter, sua parte de dentro também deveria ser.
Cresceu com a missão de ser uma muralha, dentro e fora de si. Sua Garden o preparou para isso. Mas os Homens nunca são perfeitos. sempre lhes faltam alguma coisa. E o mundo não entrava em harmonia por ausência destes pequenos detalhes.
Neste Deserto faltava esclarecimento. E Quatrocordas, agora, detinha o maior deles...
Encontrou refúgio dentro de si. Parecia que, por ora, seu corpo lá fora não podia mais responder. Agora precisava que Florença desistisse de sua obsessão, e partisse. Mas, assim como os homens, essa raça também nunca foi perfeita. E talvez o destino de ambas era coexistirem e aceitarem quem é o mais forte, fosse quem fosse. O deus vil da Areia nunca esteve com tanta sede...
— Argh! Argh! — Florença arfava enquanto desferia chutes fortes contra a proteção de Cordas. Pulou, atirou uma, duas, cinco vezes. Nada. No chão, encontrava-se de pé, mas ofegante. Aquilo era o fim para ela. Nunca havia se sentido tão mal. Pela primeira vez, resolveu respirar ar puro lá fora...
Abrindo os olhos, Florença viu o corpo do Hunter, a sua frente, tombado, desde sua queda. Fixava seu olhar nele; mesclava ódio e admiração. Sua mente queria acreditar que havia um jeito de tira-lo de lá e ter o controle dele que tinha antes. Mas não achava a resposta. Ela tinha perdido novamente? Perguntas dessa natureza a corroía por dentro numa fúria incalculada.
Perto dali, sobrevoando, passava um trio de patrulha de Lullabys. Possivelmente, faziam parte de uma patente alta da hierarquia da raça, e estavam assegurando que aquela região estivesse devidamente sob controle. Avistaram a silhueta em pé, fitando um corpo no chão e, lá de cima, fizeram um aceno com a cabeça positivamente, descendo em formação de guerra conhecido por elas.
Florença olhou pra cima e fechou ainda mais a expressão fácil, antes mesmo do trio tocar o chão.
— Florença, limpando o lixo dessa área? — Disse a Lullaby do meio;certamente sendo a lider daquela patrulha.
— Me conhece? Eu nunca vi seu rosto — Despreza a criatura.
— Todas as Lullabys da divisão EX-CUTION tem lá sua fama — responde, sem muito interesse, a líder. Em seguida, olha para o corpo ao seu lado e continua — Ora, ora, ora. Olha o que temos aqui...
As outras duas que acompanhavam ja tinham observado bem Quatrocordas, desfalecido, respirando com dificuldade. Uma delas agachou e esticou o mão para passar no rosto do homem. Florença, com o mesmo olhar que odiava aquele corpo, fitava o movimento da recém chegada. Avisou, com uma voz arrastada:
— Não toque nele!
Ela parou seu movimento no meio do caminho e ergueu a cabeça para olhar para o rosto de Florença, que estavam ficando vermelho de raiva. Deixou escapar um riso de deboche e ameaçou novamente acariciar o rosto de Cordas.
— Suas vadias só seguem suas ordens? Então pede para ela não encostar um só dedo nele. Eu cacei e eu oi derrubei. Onde está a lealdade em nossas regras? — Florença disse com rispidez.
A Lullaby agachada levantou, mudando sua expressão. A outra, do lado direito, também tomou as dores da amiga e a líder levantou a mão para que elas não avançassem ou passasse por ela. Esta, abaixou lentamente a mão e disse, suavemente:
— Florença, se você quiser os parabéns por derruba-lo, você terá. Mas este homem será levado por nós. Ordem superiores. E você não poderá fazer nada para evitar...
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