Capítulo 4: διάλογος
No relógio de bolso de Quatrocordas marcava 9 horas da manhã em números romanos. Em uma mesa pequena, um de frente para o outro, havia dois copos entre eles e a garrafa do lado direito de Vanitas. Este sempre admirou a simetria e bons costumes, de modo que ficaria atento se o copo de sua visita ameaçasse esvaziar por completo.
O cabelo curto, com sua franja caindo no rosto com madeixas levemente onduladas e maiores, de cor castanho pálido, quase cinza, transmitia transparência e calma, em conjunto com sua expressão de rosto serena. O sorriso era simples e bem presente. Naquele instante, Quatrocordas o via como uma figura ainda mais em paz. Sua expressão fica séria, sem perder a simpatia quando pergunta:
—O que exatamente trouxe Gipsy até aqui?
—É um assunto delicado... É sobre a Garden dele.
—O que aconteceu?
—Ele desconfia que está passando por problemas sérios.
— A nível de...?
— A nível Salino.
—Oh!
Vanitas fica desconcertado. Permanece alguns segundos em silêncio e recomeça:
—Mas você viu? Notou algo diferente?
—Sim, vi logo que cheguei. De fato, não parece estar bem. Gipsy teve um sonho dias atrás e esse foi bem real, por sinal. Há tempos que ele não conseguia estabelecer uma Ressonância clara. Intrigante é o fato que a voz que veio em sonho não era a que estava acostumado a ouvir. Era uma outra, quase como a nossa. E não se referia ao jardim na primeira pessoa, e sim na terceira.
—Era como se uma outra pessoa estivesse avisando Gipsy... Um Hunter, talvez...
—Não faz muito sentido, mas ouvi raras histórias, praticamente lendas, onde uma voz de Hunter entrava em Ressonância num sonho, e indicava algo na Garden do sonhador. Eu, sinceramente, nunca sonhei com isso.
—Sim, em meus estudos passei os olhos por algumas linhas que relatavam esse assunto, mas muito por cima, nada concreto e não passava, na minha opinião, de especulações vazias.Embora eu também nunca tive um sonho parecido, pretendo com o tempo ir mais a fundo nisso. Sinto que isso completará meu complexo estudo sobre as coisas que estou pesquisando...
— E você ultimamente só estuda? Nunca mais caçou Lullabys? Bem, creio que seja em respeito à Aurora...
— Na verdade, ela é só um pretexto. Não sinto vontade, pra falar a verdade, eu nunca senti essa vontade, essa ação que enchemos a boca pra dizer que é inata. Experimentei, já que meu destino havia se tornado precocemente condizente à isso que chamamos de "inato". Mas agora tenho certeza dessa decisão que estou tomando. Tudo me trouxe até aqui. Estou certo dessa minha escolha.
—Sim, você ,desde pequeno, tinha um talento inato (e isso não se pode negar) de se tornar um exímio Hunter. Nasceu com você essa capacidade e 6 anos antes de possuir a idade correta pra se tornar um, você ja tinha a graduação mais elevada da classe. Não dá nem pra comparar a capacidade entre você e Gipsy de ter conseguido a Midnight Sun. Ele foi conseguir a dele anos mais tarde, e ainda com muito esforço.
— Eu nunca dei muito valor em ser um Alone Howl. Talvez por saber desde cedo que não demoraria pra me tornar um. Sei que meus talentos são impossíveis de esconder, mas não levo isso a ferro e fogo. Por isso, me neguei a ter comigo uma Midnight sun. Tanto é que só os amigos mais próximo, como você e o Gipsy é quem sabe que tenho esse nível. Dei um jeito para que essa fama não se espalhasse.
— Mas é inevitável, tanto pra você quanto pra Gipsy. Está certo que ele esbanja e demonstra mais ou menos o nível dele aos quatro ventos. Mas, mesmo se não o fizesse, bastasse uma Lullaby ter algumas horas de luta com ele pra descobrir que entrou numa gigantesca encrenca.
—Quatrocordas, eu sempre foi muito tranquilo à isso e a energia Egocon que as Lullabys nos fornecem sempre foram pra mim algo necessário, mas em quantidade controlada. Não excedia e sequer sentia prazer em caça-las. O que aconteceu comigo e com a Aurora...bem....foi diferente. À propósito, sei que você pensa de forma parecida à minha filosofia, porque você esconde a Midnight Sun de você mesmo.
—...
— A quanto tempo você tem a sua?
— Eu...não ...
—Quatrocordas, você acha que pode me enganar? Talvez Gipsy, mas a mim...?
—... Já tenho a bastante tempo. Mas não sinto ainda que posso sair desfilando com essa insignia e abraçando todo tipo de caçada. Também sou tranquilo quanto à isso. Mas não nego que ainda não me sinto preparado.
— E aposto que você nem contou pro Gipsy que, assim como ele e eu, você é um Alone Howl?
— Não. Não sei como ele reagiria. Ele as vezes é muito competitivo, mesmo dizendo que não.
— As vezes me pergunto se isso não mais um de seus jeitos de desviar nossos olhos do que ele realmente é...
— Isso explica o fato de Gispy agora encontrar problemas na tentativa de resolução do que está passando. Se ele guarda coisas em seu interior, o que dirá da Garden dele...
— Seria possível d´ele não compreender a complexidade do próprio jardim? Ele é um cara tão inteligente...
— Inteligencia , Vanitas, nada tem a ver com Sabedoria. E isso você sabe muito bem. Gipsy foi criado por um jardim infinitamente misterioso. É normal ele ter absorvido tanto mistério em seu ser, mas até desses segredos ele foi deixado de lado. Ele vai ter de esforçar bastante pra compreender o que terá de enfrentar.
— Tem razão, Quatrocordas.
— Por isso que Gipsy é a favor de caçarmos as Lullabys e confesso que estou de pleno acordo com ele! Pegando o Egocon delas, além de ficarem temporariamente inofensivas, podemos administrar a energia de diversas formas. E, acima de tudo, silenciando essas criaturas, amenizamos o efeito maldito que elas causam em nós!
— Está aí um ponto que meus estudos me fazem ir numa direção contrária de vocês, amigo! Não é pelo efeito que elas nos causam que necessariamente a culpa seja delas!
— Como assim, Vanitas? Elas não são desse mundo! O som que elas fazem em nosso interior prejudica de forma gradual e irreversível a Ressonância Mundial. Se já não bastasse a escassez de telégrafos neste deserto global que nem sabemos onde começa e onde termina, a comunicação com as nossas Gardens se torna cada vez mais utópica. Cara, essa raça ainda vai dominar o mundo e estaremos ferrados...
— Diga-me, Quatrocordas, quem foi que disse que deveríamos caçar essa raça por ser infernal? Quem foi que nos colocou nessa guerra onde sequer existe algum Hunter vivo pra nos contar a verdade desde os primórdios? Quem decidiu que elas deveriam ser silenciadas ou até mesmo exterminadas? Não há ninguém que possa esclarecer toda essa história que nos foi vendida...
— Eu me pergunto como você consegue ficar muito tempo do lado da Aurora, por exemplo, sem enlouquecer com o barulho forte das batidas de seu coração. Além do que, elas possuem um poder incrível de ilusão que, uma vez dentro dela, temos mais chances de sair morto do que vivo. É tão real que nem sabemos distinguir a realidade.
— Quatrocordas, o que é a realidade pra você?
— Pra mim, a realidade é que essa raça entra em conflito com a nossa desde sempre. Sempre seremos nós contra elas. Eu pouco me importo com o Egocon, mas esse ruído que infecta as ondas sonoras e telepáticas, e esse maldito poder de ilusão já são motivos o bastante para eu me orgulhar de ter nascido Hunter e, como todo ser que nasce neste mundo, tem a obrigação de silenciar o máximo de Lullabys possível.
— Você não sabe o que você está falando!
—Eu não sei? Olhe pra você, Vanitas! Você é o cara mais talentoso que já conheci na vida. Você deixa um punhado de Hunters no chinelo. Tem um nível intelectual absurdo e me diz que eu não sei o que estou falando? Eu, você, Gipsy e Greenglasses ja fomos vítimas do poder esmagador de ilusão das Lullabys. Sentimos na pele a terrível dor de não ter a certeza de sobreviver à ilusão. Todos nós já fomos, ao menos uma vez, atingidos de forma brutal. Se você fala tudo isso por ter um nível elevado a ponto de se dar o capricho de conviver com uma Lullaby, tudo bem. Mas não misture as estações. Nossa realidade, principalmente do nosso grupo DeepSea, é bem diferente. Você sabe disso, senão havia aceitado entrar pro grupo anos atrás...
— Eu não estou te reconhecendo mais...
—É óbvio que não me reconhece. Você nem está mais aqui!
E foi nessa frase pronunciada que Quatrocordas, que nunca se exaltava, esmurrou a mesa.
Vanitas olhava pro amigo incrédulo. Quatrocordas também o fitava da mesma forma. Eles recuperaram a calma segundos depois. Mas precisou que cada um respirasse fundo e trouxesse às memórias a verdadeira amizade e consideração que tinha um pelo outro. Vanitas continua, com a voz contida:
— Negativo.
—...Eu já não tenho tanta certeza, Vanitas...
— Que eu estou aqui?
— Sim, que você não está mais aqui. Vivendo proximo de uma Lullaby de Rank S, mesmo você sendo páreo para ela, ela tem muito mais vantagens sobre ti, natural da raça dela.
— O que quer dizer com isso, Cordas?
— Eu receio que você está vivendo uma ilusão. Eu aposto em você e sou o primeiro a lhe defender quando Gipsy ou Glasses levantam suspeitas consideráveis. Mas aqui, eu e você, cá entre nós, começo a duvidar de sua sanidade.
— Você está querendo me dizer que eu fui atingido, é isso? Que essa minha vontade de procurar um outro caminho, de estudar, ou até mesmo meus estudos, tudo é forjado pela mentira de Aurora?
— Não citei o nome dela.
—Mas sei que você está querendo pronunciá-la como culpada. E onde estaria as supostas cicatrizes provando que fui atingido?
—Você por um acaso conhece os limites delas? Sabe até onde elas podem chegar?
—Eu... bem...
— Vanitas! Você é meu amigo. Eu me preocupo contigo. Só acho que...
— Lá fora...
— O que tem lá fora?
—...
Vanitas faz uma cara muito séria. Quatrocordas perde a linha de raciocínio e se preocupa com a expressão incomum daquele rosto sereno.
—Creio que eu tenho a prova que decidirá se estou ou não em uma ilusão.
— Lá fora onde?
— Atrás de casa.
Vanitas levanta da mesa e com a cabeça, faz sinal para seu amigo alto o seguir.
— Deixa eu esclarecer às coisas pra você, Cordas. Aurora raramente entra aqui em casa. Temos uma relação com muitos detalhes que ainda nos mantém bem afastados um do outro. Posso dizer que ela é quase uma "amiga". Sim. Sei que esse termo é novo no nosso mundo, mas prefiro usa-lo. Pedi mais cedo pra que deixasse suas armas num canto pois não sabia que reação você ou ela teria assim que Aurora adentrasse, seja qual fosse a situação. Ela geralmente fica no quintal do barraco, sentada, olhando aqui pra dentro, como se pudesse ver através de paredes.Não come. Não dorme. O que eu notei, enquanto ela passou dias e dias olhando pra cá, ou mesmo pra mim, sentada ali no quintal, é o mais assustador. Caso seja uma ilusão, só eu estarei vendo e você não. Porém, caso você enxergue, tente não...enlouquecer.
Vanitas falava isso enquanto caminhava em direção à porta dos fundos. Terminado a explicação, ele abre a porta e Quatrocordas dá de frente com a claridade do dia que cega. E com a aparição que Vanitas mencionou.
Cordas não entende. Fica confuso. Os olhos bem abertos, assustados. Demora um pouco pra ele conseguir fôlego o suficiente pra dizer:
— Isso é... impossível...!
— Então espere saber o que eu descobri ao longo dos meus estudos sobre esse fenômeno. A parte boa disso tudo é que, ao menos, eu não estou louco...
O cabelo curto, com sua franja caindo no rosto com madeixas levemente onduladas e maiores, de cor castanho pálido, quase cinza, transmitia transparência e calma, em conjunto com sua expressão de rosto serena. O sorriso era simples e bem presente. Naquele instante, Quatrocordas o via como uma figura ainda mais em paz. Sua expressão fica séria, sem perder a simpatia quando pergunta:
—O que exatamente trouxe Gipsy até aqui?
—É um assunto delicado... É sobre a Garden dele.
—O que aconteceu?
—Ele desconfia que está passando por problemas sérios.
— A nível de...?
— A nível Salino.
—Oh!
Vanitas fica desconcertado. Permanece alguns segundos em silêncio e recomeça:
—Mas você viu? Notou algo diferente?
—Sim, vi logo que cheguei. De fato, não parece estar bem. Gipsy teve um sonho dias atrás e esse foi bem real, por sinal. Há tempos que ele não conseguia estabelecer uma Ressonância clara. Intrigante é o fato que a voz que veio em sonho não era a que estava acostumado a ouvir. Era uma outra, quase como a nossa. E não se referia ao jardim na primeira pessoa, e sim na terceira.
—Era como se uma outra pessoa estivesse avisando Gipsy... Um Hunter, talvez...
—Não faz muito sentido, mas ouvi raras histórias, praticamente lendas, onde uma voz de Hunter entrava em Ressonância num sonho, e indicava algo na Garden do sonhador. Eu, sinceramente, nunca sonhei com isso.
—Sim, em meus estudos passei os olhos por algumas linhas que relatavam esse assunto, mas muito por cima, nada concreto e não passava, na minha opinião, de especulações vazias.Embora eu também nunca tive um sonho parecido, pretendo com o tempo ir mais a fundo nisso. Sinto que isso completará meu complexo estudo sobre as coisas que estou pesquisando...
— E você ultimamente só estuda? Nunca mais caçou Lullabys? Bem, creio que seja em respeito à Aurora...
— Na verdade, ela é só um pretexto. Não sinto vontade, pra falar a verdade, eu nunca senti essa vontade, essa ação que enchemos a boca pra dizer que é inata. Experimentei, já que meu destino havia se tornado precocemente condizente à isso que chamamos de "inato". Mas agora tenho certeza dessa decisão que estou tomando. Tudo me trouxe até aqui. Estou certo dessa minha escolha.
—Sim, você ,desde pequeno, tinha um talento inato (e isso não se pode negar) de se tornar um exímio Hunter. Nasceu com você essa capacidade e 6 anos antes de possuir a idade correta pra se tornar um, você ja tinha a graduação mais elevada da classe. Não dá nem pra comparar a capacidade entre você e Gipsy de ter conseguido a Midnight Sun. Ele foi conseguir a dele anos mais tarde, e ainda com muito esforço.
— Eu nunca dei muito valor em ser um Alone Howl. Talvez por saber desde cedo que não demoraria pra me tornar um. Sei que meus talentos são impossíveis de esconder, mas não levo isso a ferro e fogo. Por isso, me neguei a ter comigo uma Midnight sun. Tanto é que só os amigos mais próximo, como você e o Gipsy é quem sabe que tenho esse nível. Dei um jeito para que essa fama não se espalhasse.
— Mas é inevitável, tanto pra você quanto pra Gipsy. Está certo que ele esbanja e demonstra mais ou menos o nível dele aos quatro ventos. Mas, mesmo se não o fizesse, bastasse uma Lullaby ter algumas horas de luta com ele pra descobrir que entrou numa gigantesca encrenca.
—Quatrocordas, eu sempre foi muito tranquilo à isso e a energia Egocon que as Lullabys nos fornecem sempre foram pra mim algo necessário, mas em quantidade controlada. Não excedia e sequer sentia prazer em caça-las. O que aconteceu comigo e com a Aurora...bem....foi diferente. À propósito, sei que você pensa de forma parecida à minha filosofia, porque você esconde a Midnight Sun de você mesmo.
—...
— A quanto tempo você tem a sua?
— Eu...não ...
—Quatrocordas, você acha que pode me enganar? Talvez Gipsy, mas a mim...?
—... Já tenho a bastante tempo. Mas não sinto ainda que posso sair desfilando com essa insignia e abraçando todo tipo de caçada. Também sou tranquilo quanto à isso. Mas não nego que ainda não me sinto preparado.
— E aposto que você nem contou pro Gipsy que, assim como ele e eu, você é um Alone Howl?
— Não. Não sei como ele reagiria. Ele as vezes é muito competitivo, mesmo dizendo que não.
— As vezes me pergunto se isso não mais um de seus jeitos de desviar nossos olhos do que ele realmente é...
— Isso explica o fato de Gispy agora encontrar problemas na tentativa de resolução do que está passando. Se ele guarda coisas em seu interior, o que dirá da Garden dele...
— Seria possível d´ele não compreender a complexidade do próprio jardim? Ele é um cara tão inteligente...
— Inteligencia , Vanitas, nada tem a ver com Sabedoria. E isso você sabe muito bem. Gipsy foi criado por um jardim infinitamente misterioso. É normal ele ter absorvido tanto mistério em seu ser, mas até desses segredos ele foi deixado de lado. Ele vai ter de esforçar bastante pra compreender o que terá de enfrentar.
— Tem razão, Quatrocordas.
— Por isso que Gipsy é a favor de caçarmos as Lullabys e confesso que estou de pleno acordo com ele! Pegando o Egocon delas, além de ficarem temporariamente inofensivas, podemos administrar a energia de diversas formas. E, acima de tudo, silenciando essas criaturas, amenizamos o efeito maldito que elas causam em nós!
— Está aí um ponto que meus estudos me fazem ir numa direção contrária de vocês, amigo! Não é pelo efeito que elas nos causam que necessariamente a culpa seja delas!
— Como assim, Vanitas? Elas não são desse mundo! O som que elas fazem em nosso interior prejudica de forma gradual e irreversível a Ressonância Mundial. Se já não bastasse a escassez de telégrafos neste deserto global que nem sabemos onde começa e onde termina, a comunicação com as nossas Gardens se torna cada vez mais utópica. Cara, essa raça ainda vai dominar o mundo e estaremos ferrados...
— Diga-me, Quatrocordas, quem foi que disse que deveríamos caçar essa raça por ser infernal? Quem foi que nos colocou nessa guerra onde sequer existe algum Hunter vivo pra nos contar a verdade desde os primórdios? Quem decidiu que elas deveriam ser silenciadas ou até mesmo exterminadas? Não há ninguém que possa esclarecer toda essa história que nos foi vendida...
— Eu me pergunto como você consegue ficar muito tempo do lado da Aurora, por exemplo, sem enlouquecer com o barulho forte das batidas de seu coração. Além do que, elas possuem um poder incrível de ilusão que, uma vez dentro dela, temos mais chances de sair morto do que vivo. É tão real que nem sabemos distinguir a realidade.
— Quatrocordas, o que é a realidade pra você?
— Pra mim, a realidade é que essa raça entra em conflito com a nossa desde sempre. Sempre seremos nós contra elas. Eu pouco me importo com o Egocon, mas esse ruído que infecta as ondas sonoras e telepáticas, e esse maldito poder de ilusão já são motivos o bastante para eu me orgulhar de ter nascido Hunter e, como todo ser que nasce neste mundo, tem a obrigação de silenciar o máximo de Lullabys possível.
— Você não sabe o que você está falando!
—Eu não sei? Olhe pra você, Vanitas! Você é o cara mais talentoso que já conheci na vida. Você deixa um punhado de Hunters no chinelo. Tem um nível intelectual absurdo e me diz que eu não sei o que estou falando? Eu, você, Gipsy e Greenglasses ja fomos vítimas do poder esmagador de ilusão das Lullabys. Sentimos na pele a terrível dor de não ter a certeza de sobreviver à ilusão. Todos nós já fomos, ao menos uma vez, atingidos de forma brutal. Se você fala tudo isso por ter um nível elevado a ponto de se dar o capricho de conviver com uma Lullaby, tudo bem. Mas não misture as estações. Nossa realidade, principalmente do nosso grupo DeepSea, é bem diferente. Você sabe disso, senão havia aceitado entrar pro grupo anos atrás...
— Eu não estou te reconhecendo mais...
—É óbvio que não me reconhece. Você nem está mais aqui!
E foi nessa frase pronunciada que Quatrocordas, que nunca se exaltava, esmurrou a mesa.
Vanitas olhava pro amigo incrédulo. Quatrocordas também o fitava da mesma forma. Eles recuperaram a calma segundos depois. Mas precisou que cada um respirasse fundo e trouxesse às memórias a verdadeira amizade e consideração que tinha um pelo outro. Vanitas continua, com a voz contida:
— Negativo.
—...Eu já não tenho tanta certeza, Vanitas...
— Que eu estou aqui?
— Sim, que você não está mais aqui. Vivendo proximo de uma Lullaby de Rank S, mesmo você sendo páreo para ela, ela tem muito mais vantagens sobre ti, natural da raça dela.
— O que quer dizer com isso, Cordas?
— Eu receio que você está vivendo uma ilusão. Eu aposto em você e sou o primeiro a lhe defender quando Gipsy ou Glasses levantam suspeitas consideráveis. Mas aqui, eu e você, cá entre nós, começo a duvidar de sua sanidade.
— Você está querendo me dizer que eu fui atingido, é isso? Que essa minha vontade de procurar um outro caminho, de estudar, ou até mesmo meus estudos, tudo é forjado pela mentira de Aurora?
— Não citei o nome dela.
—Mas sei que você está querendo pronunciá-la como culpada. E onde estaria as supostas cicatrizes provando que fui atingido?
—Você por um acaso conhece os limites delas? Sabe até onde elas podem chegar?
—Eu... bem...
— Vanitas! Você é meu amigo. Eu me preocupo contigo. Só acho que...
— Lá fora...
— O que tem lá fora?
—...
Vanitas faz uma cara muito séria. Quatrocordas perde a linha de raciocínio e se preocupa com a expressão incomum daquele rosto sereno.
—Creio que eu tenho a prova que decidirá se estou ou não em uma ilusão.
— Lá fora onde?
— Atrás de casa.
Vanitas levanta da mesa e com a cabeça, faz sinal para seu amigo alto o seguir.
— Deixa eu esclarecer às coisas pra você, Cordas. Aurora raramente entra aqui em casa. Temos uma relação com muitos detalhes que ainda nos mantém bem afastados um do outro. Posso dizer que ela é quase uma "amiga". Sim. Sei que esse termo é novo no nosso mundo, mas prefiro usa-lo. Pedi mais cedo pra que deixasse suas armas num canto pois não sabia que reação você ou ela teria assim que Aurora adentrasse, seja qual fosse a situação. Ela geralmente fica no quintal do barraco, sentada, olhando aqui pra dentro, como se pudesse ver através de paredes.Não come. Não dorme. O que eu notei, enquanto ela passou dias e dias olhando pra cá, ou mesmo pra mim, sentada ali no quintal, é o mais assustador. Caso seja uma ilusão, só eu estarei vendo e você não. Porém, caso você enxergue, tente não...enlouquecer.
Vanitas falava isso enquanto caminhava em direção à porta dos fundos. Terminado a explicação, ele abre a porta e Quatrocordas dá de frente com a claridade do dia que cega. E com a aparição que Vanitas mencionou.
Cordas não entende. Fica confuso. Os olhos bem abertos, assustados. Demora um pouco pra ele conseguir fôlego o suficiente pra dizer:
— Isso é... impossível...!
— Então espere saber o que eu descobri ao longo dos meus estudos sobre esse fenômeno. A parte boa disso tudo é que, ao menos, eu não estou louco...
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